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segunda-feira, 14 de outubro de 2013 0 comentários

PAROLAGEM DA VIDA






Como a vida muda.
 Como a vida é muda.
 Como a vida é nula.
 Como a vida é nada.
 Como a vida é tudo.
 Tudo que se perde
 mesmo sem ter ganho.
 Como a vida é senha
 de outra vida nova
 que envelhece antes
 de romper o novo.
 Como a vida é outra
 sempre outra, outra
 não a que é vivida.
 Como a vida é vida
 ainda quando morte
 esculpida em vida.
 Como a vida é forte
 em suas algemas.
 Como dói a vida
 quando tira a veste
 de prata celeste.
 Como a vida é isto
 misturado àquilo.
 Como a vida é bela
 sendo uma pantera
 de garra quebrada.
 Como a vida é louca
 estúpida, mouca
 e no entanto chama
 a torrar-se em chama.
 Como a vida chora
 de saber que é vida
 e nunca nunca nunca
 leva a sério o homem,
 esse lobisomem.
 Como a vida ri
 a cada manhã
 de seu próprio absurdo
 e a cada momento
 dá de novo a todos
 uma prenda estranha.
 Como a vida joga
 de paz e de guerra
 povoando a terra
 de leis e fantasmas.
 Como a vida toca
 seu gasto realejo
 fazendo da valsa
 um puro Vivaldi.
 Como a vida vale
 mais que a própria vida
 sempre renascida
 em flor e formiga
 em seixo rolado
 peito desolado
 coração amante.
 E como se salva
 a uma só palavra
 escrita no sangue
 desde o nascimento:
 amor, vidamor!


Carlos Drummond de Andrade
domingo, 13 de outubro de 2013 0 comentários

METAMORFOSES



Não há coisa alguma que persista em todo o Universo. Tudo flui, e tudo só apresenta uma
imagem passageira. O próprio tempo passa com um movimento contínuo, como um rio... O
que foi antes já não é, o que não tinha sido é, e todo instante é uma coisa nova. Vês a noite,
próxima do fim, caminhar para o dia, e à claridade do dia suceder a escuridão da noite...

Não vês as estações do ano se sucederem, imitando as idades de nossa vida? Com efeito, a
primavera, quando surge, é semelhante à criança nova... A planta nova, pouco vigorosa,
rebenta em brotos e enche de esperança o agricultor. Tudo floresce. O fértil campo
resplandece com o colorido das flores, mas ainda falta vigor às folhas. Entra, então, a quadra mais forte e vigorosa, o verão: é a robusta mocidade, fecunda e ardente.


 Chega, por sua vez, o outono: passou o fervor da mocidade, é a quadra da maturidade, o meio-termo entre o jovem e o velho; as têmporas embranquecem. Vem, depois, o tristonho inverno: é o velho trôpego, cujos cabelos ou caíram como as folhas das árvores, ou, os que restaram,
estão brancos como a neve dos caminhos. Também nossos corpos mudam sempre e sem
descanso... E também a Natureza não descansa e, renovadora, encontra outras formas nas
formas das coisas.
Nada morre no vasto mundo, mas tudo assume aspectos novos e
variados... Todos os seres têm sua origem noutros seres.


Existe uma ave a que os fenícios dão o nome de fênix. Não se alimenta de grãos ou ervas, mas das lágrimas do incenso e do
suco da amônia. Quando completa cinco séculos de vida, constrói um ninho no alto de uma
grande palmeira, feito de folhas de canela, do aromático nardo e da mirra avermelhada. Ali
se acomoda e termina a vida entre perfumes. De suas cinzas, renasce uma pequena fênix,
que viverá outros cinco séculos... Assim também é a Natureza e tudo o que nela existe e
persiste.


Ovídio, Metamorfoses.



Links indicados: SOBRE OS POETAS E A MENTIRA

DIFICULDADE PARA A BUSCA DA VERDADE

ESPANQUEMOS OS POBRES!

ILHA DAS FLORES (curta)
 
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